Quem já fechou os olhos e tentou caminhar sozinho por um ambiente desconhecido tem uma leve ideia do desafio enfrentado pelas pessoas cegas ou com baixa visão. As depressões, os obstáculos e a falta de alertas sonoros são apenas algumas das barreiras que causam grandes transtornos à rotina das pessoas com deficiência visual e dificultam sua inserção na sociedade. O Instituto IRIS, organização sem fins lucrativos fundada em 2002, nasceu com a missão de desenvolver atividades e projetos que acelerem o processo de inclusão social das pessoas com deficiência.
No Brasil, 6,5 milhões de pessoas possuem deficiência visual – 582 mil são cegas e seis milhões têm baixa visão, de acordo com o Censo 2010, conduzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com sua autonomia comprometida, essas pessoas encontram dificuldades para ingressar no mercado de trabalho e realizar as atividades do cotidiano. Na tentativa de mudar esse cenário, o Instituto IRIS foi um dos pioneiros na difusão do cão-guia como facilitador do processo de inclusão da pessoa com deficiência visual no Brasil. Dos mais de 100 cães-guias existentes no País, mais de 40 foram doados pelo Instituto ao longo de seus 17 anos. É uma bela história, mas que precisa do apoio de toda a sociedade para continuar: só no Instituto mais 3 mil pessoas aguardam para receber um desses cães. Até hoje eles foram doados pelo IRIS por meio de uma parceria com uma escola especializada em treinar cães-guias nos EUA, mas o Instituto sonha em criar uma estrutura para treiná-los no Brasil, o que diminuiria os altos custos envolvidos no processo e aumentaria as chances de os deficientes visuais terem acesso a esse benefício.
O advogado Marcelo Panico tem propriedade para falar sobre a importância de Instituições como o IRIS. Ele perdeu a visão aos 33 anos e passou a usar a bengala para ter mais autonomia: “Ela é fundamental para os cegos, mas também é um instrumento frio, marcante, que estigmatiza. As pessoas não têm muito o que falar, não sabem como interagir com a gente”, diz. “E tem mais um agravante: ela afasta as pessoas, porque quando você está passando a bengala, elas saem da frente”. Segundo Marcelo, com o cão-guia a situação é diferente: “Foi uma mudança muito grande na minha vida, graças ao grande trabalho do Instituto IRIS, e também do cachorro”, diz Marcelo, que após seis anos de uso da bengala, recebeu Harley, seu primeiro cão-guia. Com ele, Marcelo conquistou muito mais que independência. “Ele te inclui na sociedade, pois não é a cegueira que chega na frente, é o cão-guia”, afirma.
Marcelo lembra bem do impacto que essa mudança causou em sua rotina quando, em 2007, retornou dos EUA com Harley: “Eu trabalhava em uma empresa com cinco mil pessoas e a equipe do meu departamento mal falava comigo. De repente isso mudou e todos ‘puxavam conversa’ – das pessoas mais simples ao presidente”, conta. Por isso, ele afirma que o cão-guia quebra barreiras de atitude: “As pessoas perguntam o nome dele, comentam sobre como é comportado, falam de seus próprios cachorros. Ou seja, elas abordam vários assuntos e acabam entendendo que o cego conversa, trabalha, tem conta pra pagar, como todo mundo”. Atualmente com 15 anos, Harley vive com Marcelo e sua família, agora como um cão aposentado. O advogado conta hoje com o apoio de Rudy, seu segundo cão-guia, treinado não só para desviar dos lugares, mas também para encontrar a melhor porta para entrar em ônibus, elevadores e metrôs. “Ele desobedece quando a gente dá o comando para atravessar uma rua e ele sabe que não vai dar tempo de chegar do outro lado da calçada”, explica Marcelo. Por tudo isso, ele tem uma grande admiração pelos cães-guia. “A gente acaba respeitando essa dedicação, que eu acho que só o cachorro tem. É realmente o melhor amigo do homem e no caso do cão-guia, é um trabalho fantástico”, conclui.
Descrição da imagem #pracegover Em primeiro plano, há uma mão com a palma virada para cima, como se estivesse convidando alguém para seguir junto. Ao fundo aparece o mar, desfocado.
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